Há dias, num jantar de amigos, alguém chamou à mesa o caso dos ovos atirados a Daniel Sampaio na conferência de imprensa do Sporting CP.
- O Daniel Sampaio, psiquiatra?! O irmão do Dr. Jorge Sampaio?!
- Sim, esse mesmo.
- Mas, porque razão é que uma pessoa com a classe, distinção e inteligência do Dr. Daniel Sampaio se mete nestas alhadas?
Porque sim, porque é um dever, porque é a mais importante mudança que a nossa sociedade precisa viver. O associativismo, o voluntariado, a ação política são a cola que une a sociedade e que dão, ou devem dar, à democracia o sustento que precisa para que seja refundada. Todos os cidadãos devem procurar participar de forma ativa na vida das coletividades que mais gostam; nas instituições sociais que desenvolvem atividades que respondem melhor às necessidades que consideramos mais importantes; na vida e nas decisões tomadas na autarquia local (nas juntas de freguesia e nas câmaras municipais); na política, procurando contribuir positivamente para a melhoria da imagem da vida política, para melhores decisões, mais honestas e mais justas.
É assim que se constrói democracia, é assim que nos aproximamos da democracia.
Mas este é um caminho difícil, quase sempre feito sem nenhum retorno financeiro, com muito investimento de tempo e disponibilidade. Mas é, na minha opinião, o único caminho para que se evitem atropelos democráticos, decisões injustas e desonestidades com consequências públicas (as privadas cada um fica com elas).
Se o Dr. Daniel Sampaio se sujeita a levar com ovos é porque sente o dever de participar na vida do clube que gosta, porque considera que há melhores caminhos para percorrer e porque acredita ter condições que lhe permitirão decidir melhor que outros.
Ficar na margem, a assobiar e atirar ovos é sempre demasiado fácil.
Na freguesia em que nasci e cresço, Esmoriz, tem-se vivido um folhetim de consequências graves para a população local e onde posso encontrar algumas semelhanças com tanta coisa má que se passa na nossa sociedade. Depois do fervor social pós-revolução, em que se viveram momentos únicos de participação (política e associativa), Esmoriz começou a sofrer lentamente de uma crescente abstenção social. A população deixou de participar na vida dos clubes (lembro que no início dos anos 80 o Esmoriz GC foi bi-campeão nacional de voleibol elevando bem alto o nome da cidade), a população deixou de participar na vida política da freguesia, a população desligou-se das decisões, deixou-se estar no passeio a ver a procissão, criticando, contribuindo para o descrédito das instituições, traçando, sem saber, um caminho perigoso que nos trouxe até hoje.
Esmoriz está, desde novembro, sob gestão de uma comissão administrativa nomeada (portanto, não eleita) pelo Governo. Porquê? Porque, democraticamente, os elementos com mandatos na Assembleia de Freguesia, que é o órgão máximo da autarquia local, consideraram que a situação que se vivia no executivo da Junta de Freguesia era insustentável e renunciaram aos seus mandatos. Isto é a democracia a funcionar em pleno.
Foi então nomeada uma comissão administrativa e agendadas eleições intercalares que resultaram na vitória de uma das listas por uma margem de apenas 4 votos. Em democracia, o ato eleitoral é fundamental e reveste-se de um conjunto de regras que importam respeitar. E no ato eleitoral do dia 13 de janeiro não foram apresentadas, em qualquer das dez assembleias de voto, qualquer tipo de reclamação que pudesse levantar algum tipo de suspeita sobre o regular processo eleitoral. Processo eleitoral que fica terminado com a realização de uma assembleia de apuramento geral presidida pelo Juíz do Tribunal da Comarca.
Pois, mas tudo parecia estar bem - votos contados, apuramento correto, atas limpas, votos nulos e brancos certificados - até que a representante de uma das listas decidiu apresentar um recurso, recurso que chegou até ao Tribunal Constitucional.
Ora então vamos lá ver. Existem procedimentos para a realização e certificação das eleições, mas há uma cidadã que resolve achar que as eleições foram fraudulentas, atira acusações em todos os sentidos, levanta suspeitas muito graves sobre tudo e todos e lança uma aura de santidade sobre si própria.
Pior que isso, como é presidente da Comissão Administrativa e primeira responsável pela marcação da tomada de posse da nova Assembleia de Freguesia, democraticamente eleita, faz arrastar o processo com um conjunto de fait divers inacreditáveis, talvez considerando que a freguesia tem mais a ganhar com uma comissão administrativa que tem apenas poderes de gestão corrente do que com a rápida reposição da normalidade democrática.
Cidadania é participar, é estar presente e é evitar que estes tiques de autoritarismo, de despotismo possam algum dia ser a realidade na nossa sociedade.
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